Por que 8 de março é o Dia Internacional da Mulher?
O primeiro Dia Nacional da Mulher foi celebrado em maio de 1908 nos Estados Unidos
As histórias que remetem à criação do Dia Internacional da Mulher alimentam o imaginário de que a data teria surgido a partir de um incêndio em uma fábrica têxtil de Nova York em 1911, quando cerca de 130 operárias morreram carbonizadas. Sem dúvida, o incidente ocorrido em 25 de março daquele ano marcou a trajetória das lutas feministas ao longo do século 20, mas os eventos que levaram à criação da data são bem anteriores a este acontecimento.
Desde o final do século 19, organizações femininas oriundas de movimentos operários protestavam em vários países da Europa e nos Estados Unidos. As jornadas de trabalho de aproximadamente 15 horas diárias e os salários medíocres introduzidos pela Revolução Industrial levaram as mulheres a greves para reivindicar melhores condições de trabalho e o fim do trabalho infantil, comum nas fábricas durante o período.
Desde o final do século 19, organizações femininas oriundas de movimentos operários protestavam em vários países da Europa e nos Estados Unidos. As jornadas de trabalho de aproximadamente 15 horas diárias e os salários medíocres introduzidos pela Revolução Industrial levaram as mulheres a greves para reivindicar melhores condições de trabalho e o fim do trabalho infantil, comum nas fábricas durante o período.
Em 1910, durante a II Conferência Internacional de Mulheres Socialistas na Dinamarca, uma resolução para a criação de uma data anual para a celebração dos direitos da mulher foi aprovada por mais de cem representantes de 17 países. O objetivo era honrar as lutas femininas e, assim, obter suporte para instituir o sufrágio universal em diversas nações.
Com a Primeira Guerra Mundial (1914-1918) eclodiram ainda mais protestos em todo o mundo. Mas foi em 8 de março de 1917 (23 de fevereiro no calendário Juliano, adotado pela Rússia até então), quando aproximadamente 90 mil operárias manifestaram-se contra o Czar Nicolau II, as más condições de trabalho, a fome e a participação russa na guerra - em um protesto conhecido como "Pão e Paz" - que a data consagrou-se, embora tenha sido oficializada como Dia Internacional da Mulher, apenas em 1921.
Somente mais de 20 anos depois, em 1945, a Organização das Nações Unidas (ONU) assinou o primeiro acordo internacional que afirmava princípios de igualdade entre homens e mulheres. Nos anos 1960, o movimento feminista ganhou corpo, em 1975 comemorou-se oficialmente o Ano Internacional da Mulher e em 1977 o "8 de março" foi reconhecido oficialmente pelas Nações Unidas.
"O 8 de março deve ser visto como momento de mobilização para a conquista de direitos e para discutir as discriminações e violências morais, físicas e sexuais ainda sofridas pelas mulheres, impedindo que retrocessos ameacem o que já foi alcançado em diversos países", explica a professora Maria Célia Orlato Selem, mestre em Estudos Feministas pela Universidade de Brasília e doutoranda em História Cultural pela Universidade de Campinas (Unicamp).
“Quando uma amiga me perguntou o que devia fazer para criar sua filha como feminista, minha primeira reação foi pensar que eu não sabia. Parecia uma tarefa imensa”, conta Chimamanda Ngozi Adichie na introdução do livro “Para Educar Crianças Feministas – Um manifesto”. A escritora nigeriana é autora de outros títulos consagrados na literatura mundial como "Americanah", "Sejamos Todos Feministas" e "Meio Sol Amarelo".
Chimamanda foi desafiada por uma amiga que acabara de ter uma filha sobre como oferecer uma Educação igualitária em relação ao gênero. A carta – com algumas alterações – acabou dando origem ao livro “Para Educar Crianças Feministas”. São 15 sugestões – que se desdobram também em reflexões – de mudanças simples na maneira de falar e nas ações que podem ajudar no processo de uma criação igualitária entre meninas e meninos. Trazemos a seguir algumas dessas reflexões:
1. Nem sempre é fácil identificar o machismo nosso de cada dia, já que muitas das situações estão arraigadas em nossa cultura. A autora tem uma “ferramenta” muito básica para fazer tirar a dúvida: trocar o gênero do sujeito da frase. Por exemplo: experimente trocar frases ouvidas na escola, como “Futebol é para meninos” por “Futebol é para meninas”. Faz sentido? Ou se a diretora toma uma atitude que desagrada à família de um aluno e a figura masculina responsável vai tirar satisfação, será o mesmo aconteceria com um diretor do sexo masculino? Se invertermos o gênero e o resultado for mantido, não se trata de um machismo. Mas se a inversão não soar possível, podemos estar diante de um machismo.
2. Não use a “tradição” para justificar os papéis assumidos por homens e mulheres e dê os exemplos. “O trabalho de cuidar da casa e dos filhos não deveria ter gênero, o que devemos perguntar não é se uma mulher consegue dar conta de tudo, e sim qual é a melhor maneira de apoiar o casal em suas duplas obrigações no emprego e no lar”, escreve Chimamanda. Do mesmo jeito que acontece nas divisões de tarefas, a tradição não deveria ser usada para justificar a escolha de brinquedos, brincadeiras e esportes ou mesmo comportamentos. Mas não adianta ficar só um discurso. As crianças principalmente seguindo exemplos. Por isso, se a sua intenção é dar uma Educação mais igualitária em relação ao gênero, é preciso praticar todos os dias.
3. Ensine as crianças a questionarem a linguagem. A autora vê a linguagem como um repositório de preconceitos. Muitas das frases, expressões e até adjetivos que usamos contêm esse sexismo. Entre os exemplos trazidos por Chimamanda estão a clássica “Já está na idade de achar um marido” (ou o “Já pode casar” quando alguma menina mostra suas habilidades com tarefas domésticas, como limpar a casa ou cozinhar) ou um acidente de trânsito envolvendo um motorista homem e outro mulher (e esta última é acusada de ser a “culpada” pelo acidente), quando dizem a ela para chamar o marido para resolver porque ele “não vai lidar com uma mulher”. Está presente até mesmo ao chamar as meninas pequenas de “princesas”. Por mais “inocentes” que possam parecer algumas palavras e expressões usadas, elas contêm um “peso” moral e de valor atrelados à nossa herança cultural. No caso do “princesa”, ele vem carregado com um imaginário de contos de fadas, no qual uma donzela indefesa e frágil será salva por um homem. “As mulheres, na verdade, não precisam ser defendidas ou reverenciadas; só precisam ser tratadas como seres humanos iguais”, registra a autora.
4. Não faça das mulheres seres moralmente superiores aos homens. Chimamanda identifica que há uma tendência a converter oprimidos em santos. E ao falar sobre opressão nos discursos de gênero, esse cuidado precisa ser tomado. “Pessoas más e desonestas continuam sendo seres humanos e continuam a merecer dignidade”, escreve. Colocando homens e mulheres como seres iguais, ela aponta que ambos os sexos estão fadados a acertar e errar, ser bons e maus, honestos e desonestos.
5. Não pratique o “feminismo leve”. A expressão é usada pela nigeriana para designar ideias e situações em que a igualdade feminina é condicional a um homem. Para ela, algumas analogias (“Ele é a cabeça, mas você é o pescoço”) e palavras em determinados contextos (“poder”, “permitir” e “deixar”) tentam amenizar o protagonismo, papel e/ou mérito das mulheres. A escritora cita o caso de um jornal que, ao falar da primeira-ministra britânica Theresa May, descreveu seu marido como “conhecido na política como o homem que ficou no banco de trás e deixou sua esposa, Theresa, brilhar”. A proposta de Chimamanda aqui é usar a “ferramenta de troca de gênero” apresentada no item 1. Se ele fosse o primeiro-ministro e ela a esposa, esse contexto do “deixar” parece factível? “O marido não é um diretor de escola. A esposa não é uma colegial. Permitir e deixar, quando são usados unilateralmente – e em geral é apenas assim que são usados –, nunca deveriam fazer parte da linguagem de um casamento igualitário”.
Outras reflexões sobre o papel de gênero e como praticamos machismos inconscientes podem ser encontradas no livro “Para Educar Crianças Feministas – Um manifesto” (Companhia das Letras, 96 págs.).
A escritora nigeriana Chimamanda Ngozi Adichie. Crédito: Divulgação
fonte: https://novaescola.org.br/conteudo/301/por-que-8-de-marco-e-o-dia-internacional-da-mulher
https://novaescola.org.br/conteudo/10180/licoes-para-educar-criancas-feministas